O que significa a bofetada em Jesus?
Há alguns domingo atrás, enquanto compartilhávamos o sermão, no Evangelho de João, capítulo dezoito, solicitei que as pessoas pensassem na possibilidade de levarem uma bofetada no rosto, estando amarrados. Pedi que pensassem o quanto isso seria ultrajante. Percebi uma reação de repulsa a ideia! Pois é, ninguém gostaria de passar por tal situação de violência e indignidade, mas foi o que Jesus recebeu ao ser dirigido aos sacerdotes, por não responder conforme julgavam que deveria responder. Se isso tem caráter desrespeitoso entre pessoas perversas como eu e você, imagina o significado desta ação contra Jesus, o Deus encarnado.
Quero considerar somente alguns aspectos olhando para o texto que nos foi exposto no domingo:
Então, o sumo sacerdote interrogou a Jesus acerca dos seus discípulos e da sua doutrina. Declarou-lhe Jesus: Eu tenho falado francamente ao mundo; ensinei continuamente tanto nas sinagogas como no templo, onde todos os judeus se reúnem, e nada disse em oculto.Por que me interrogas? Pergunta aos que ouviram o que lhes falei; bem sabem eles o que eu disse. Dizendo ele isto, um dos guardas que ali estavam deu uma bofetada em Jesus, dizendo: É assim que falas ao sumo sacerdote? (João 18.19-22).
Foi assim, conforme está no texto acima, em letras destacadas, que li o texto quando estava me preparando para o sermão. Fiquei muito impactado pelas verdades que este relato me apresentou. E é a partir disso que quero considerar apenas dois pontos com você nesta Pastoral.
- Esta bofetada foi apenas umas das primeiras ações odiosas na terrível narrativa do processo que levaria Jesus de Nazaré à condenação e ao martírio que culminaria na cruz. Um processo de dores, vergonha e pleno desrespeito à vida e aquele que somente expunha a verdade e falava de seu Reino de paz e de justiça. Como pode Jesus passar por tudo isso sendo ele mesmo o Deus que Moises se viu obrigado a tirar a sandálias dos pés diante dele? Moisés estavadiante desse Deus e por isso aquele lugar se tornava santificado (Êxodo 3). O mesmo Deus que, em Isaias 6, o profeta teme estar em sua presença gloriosa, pois sabia de sua pecaminosidadeque se contrastava com o Deus Santo, agora esse mesmo Deus em forma humana estava sendo amarrado como um animal para ser abatido e esbofeteado no rosto. O mesmo Deus que em Êxodo 19 revela seu poder e majestade fazendo que o Monte Sinai fumegasse e trovões fossem vistos com temor, agora estava sendo julgado como um culpado e insolentemaldito. E tudo isso porque Deus decidiu se manifestar ao homem como homem e se fazer maldito e culpado por nossas culpas. É constrangedor,diante dessa bofetada,saber que nos reunimos para adorar dominicalmente em nome desse Jesus, o mesmo que criou todas as coisas para ele mesmo (Colossenses 1). Envergonha-me esta bofetada, pois quero ver a face de meu Senhor e me emociona pensar que um dia poderei me ajoelhar em sua presença e adora-lo. Tenho constrangimento do que somos e de saber como ele nos amou. O único digno de toda honra e louvor se pôs como sacrifício voluntário, recebendo a bofetada, a coroa de espinho, a cusparada, a lança e a cruz em meu lugar.
- Mas esta bofetada em Jesus também revela quem somos. Ainda me surpreende ver como nos impactamos, como que surpresos, em constatarmos a perversidade humana a cada dia. A Bíblia já nos fala que não há ninguém que seja bom e justo (Romanos 3) e não por acaso Santo Agostinho bem observava a depravação do homem. As atrocidades que vemos todos dias nos jornais e todo tipo de mídias apenas revelam parte do que TODOS NÓS SOMOS, SEM EXCEÇÃO, e do que somos capazes de realizar. Somos estes homens e mulheres maus e perversos, egoístas e auto-adores e estamos ali representados diante de Jesus por aquele que lhe dava a bofetada. Nosso ódio para com o semelhante apenas revela nosso ódio natural por esse Deus (Efésios 2), que ali estava sendo manifestado pelo Filho, Jesus Cristo.
Portanto, a bofetada sofrida por Jesus revela o seu caráter benigno e nossa maldade. Mas há motivo de alegria, pois a obra de reconciliação com o Pai estava sendo construída em cada sofrimento e desprezo que sofria Jesus, até a cabal cruz e a ressurreição. Assim, nele, podemos ser perdoados e deixar nossa velha natureza perversa e viver uma nova realidade eterna, mas lembrando sempre, enquanto aqui estivermos, de quem deu a bofetada e quem a recebeu, sendo inculpável.
Pr. Ilton Sampaio de Araujo